Quando a privada mortal estourou o crânio de um torcedor
em Pernambuco, o barulho que ouvi foi o eco de uma pedra que encontrou o fundo
do poço.
No parapeito de um estádio de futebol, com a porcelana nas
mãos, o agora identificado como Everton Filipe Santana era a semelhança de
alguém que encosta na borda de um poço no meio do mato e quer saber se é fundo.
Ao jogar uma pedrinha lá dentro, o sujeito consegue ter uma noção de sua
profundidade, se talvez há água ali.
O poço que se abriu por instantes no Estádio do Arruda
era escuro, macabro e selvagem. Era uma fenda que nos ligava ao que temos de
mais primitivo e animalesco. Na pele de Everton Santana, num gesto insano,
resolvemos testá-lo.
A notícia que tenho é que parece faltar pouco para
chegarmos ao nível mais baixo desse poço maldito.
Pela frequência e capilaridade, deixaram de ser isolados
os casos de violência extrema que vemos no noticiário.
É o ladrão que foi
espancado e amarrado ao poste, o pedófilo suspeito que teve o pênis cortado, a
dentista que foi queimada viva por assaltantes, outra dentista que foi
estuprada e assaltada em seu consultório. Teve a família que encontrou a cabeça
do parente em uma mochila na porta de casa e o juiz de futebol degolado dentro
de campo. A mulher arrastada no asfalto por uma viatura de polícia foi seguida
pelo menino diabético morto pelo padrasto por excesso de insulina e o menino morto
pela madrasta com uma injeção letal.
As capitais estão anestesiadas com a violência e as
cidades pequenas chocadas a crueza do que seria impensável. Não há para onde
correr.
Penso: será que foi sempre assim?
Talvez pedófilos, assassinos
cruéis e toda sorte de barbaridade sempre tenham existido, a diferença é que
hoje há muito mais olhos para ver.
Com uma câmera em cada celular e uma notícia
por segundo na internet, o que antes passaria batido hoje ganha repercussão
nacional.
O caso mais recente acertou esta questão de maneira
atordoante.
A mulher do Guarujá foi espancada até a morte pelos vizinhos por
causa de um boato em uma página do Facebook. A página dizia que uma mulher
estaria sequestrando crianças para rituais de magia negra e publicou um retrato
falado.
Os detalhes do caso são cinzentos, mas o que se tem
certeza é:
- Não houve nenhum caso de sequestro ou morte de crianças
em rituais no Guarujá nos últimos meses.
- O retrato falado foi feito no Rio de Janeiro para
descrever uma mulher que cometeu um crime em 2012.
Por acaso, o retrato se parece com a mulher do Guarujá.
Os moradores, mesmo sem ter uma criança desaparecida para suspeitar, mesmo que
a mulher fosse mãe de duas crianças, trucidaram-na porque ela se parecia com um
desenho que eles viram no Facebook.
“Click, plau plau plau e acabou. Sem dó e sem dor”,
diriam os Racionais.
Parece loucura, mas a privada atirada do Recife cruzou o mapa do país e acertou
uma vítima no Guarujá.
As mãos têm o mesmo dono: a estupidez.
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