domingo, 27 de março de 2011
B de Brics, B de bão
A arara azul e Hollywood
Em meio a novas posições brasileiras a respeito do Irã, abstenção em combater Gaddafi (concordando com os outros Brics) e ainda discutindo a recente visita de Obama (o que diabos quer dizer esse "apreço"?) chega aos cinemas a animação em 3-D "Rio" que traz o Brasil aos holofotes enxergado com os óculos de Hollywood.
Ainda não assisti ao filme, mas pelo que fiquei sabendo, temos muito do velho clichê de país tropical, em que pessoas sambam enlouquecidas pelas ruas acompanhadas de araras e distribuindo macacos pro Stallone. Ok, ok, a natureza brasileira é realmente maravilhosa e única, mas poxa vida, essa brasilidade de exportação não é vivida por todo habitante canarinho.
Muitos brasileiros podem passar a vida inteira sem topar com um índio e com certeza os postes não são poleiros para papagaios e araras. Insistem em retratar nosso país de uma maneira distorcida, exagerada. Olha, adoro um pão de queijo, pé de moleque e acarajé. Mas o acarajé que eu como é vendido por uma senhora negra numa saia armada branca. Ela se folcloriza para vender o acarajé pra mim. Não é uma coisa que se integrou no meu cotidiano de paulista do interior, saca? É diferente do pão de queijo que está presente até no boteco chinês mais obscuro.
O caso é que a sociedade brasileira é essencialmente urbana, pasteurizada. São heróis os que preservam a cultura brasileira. O samba é popular por aqui? É sim. Mas o samba se fundiu à música pop, numa alquimia muito peculiar. A Garota de Ipanema é folclore para as massas. Inimigos da HP é entretenimento de verdade. A distância é quilométrica, mas é o máximo de verdade que podemos dar sobre o quanto o brasileiro de hoje gosta de samba.
Quer um exemplo de uma coisa que coincide com a imagem do Brasil lá fora e a relidade? A paixão pelo futebol. Isso é genoíno. De cada dez brasileiros, pelo menos uns 8 são fanáticos por um time. Ou pelo menos torcem de leve. Se o comportamento extremo diz algo sobre uma sociedade, no Brasil não temos conflitos por religião, mas briga de torcedores rivais mata.
quarta-feira, 23 de março de 2011
Uma chance para os clássicos
"Fascinado, o garoto corria nos corredores entre os stands. Gritava, pulava e ofegava quando, maravilhado, percebeu um dos que estava procurando. Exibido em um suporte na frente do stand da editora, estava um reluzente exemplar da compilação de crônicas de Carlos Drummond de Andrade. O moleque catou o catatau e não largou mais. Era seu presente de aniversário. Não queria iPhone, Xbox, iPad ou outro demônio eletrônico. Sua imaginação incendiava só pensando em abrir o livro que tinha nas mãos. Era seu universo portátil. Era um teletransporte instantâneo. Sua nave secreta. Um guarda-roupa de fantasias. A lupa para espiar a vida dos outros, vestir sua carne, usar seus óculos."
Click. Desliga.
De volta à realidade, não é esse o sonho de consumo do jovem brasileiro médio. Mas parece que para quem cuida do conteúdo das escolas, parece razoável que garotos de 15 a 17 anos tenham afinidade com os clássicos da literatura nacional. Ah sim, porque nos vestibulares das principais faculdades públicas brasileiras é recomendada a leitura simultânea de obras imortais. Assim, "Memórias de Um Sargento de Milícias", "O Guarani", "Senhora", "Quincas Borba" e tantos outros caem de paraquedas na vida do adolescente brasileiro.
A questão é: autores clássicos e de irrefutável importância e qualidade são lidos com desânimo e contrariaedade pela molecada. A grande maioria não está preparada para eles. Simplesmente não estão a fim. Não é culpa da juventude pois tudo tem seu tempo. Estão enfiando estas grandes mentes da literatura goela abaixo dos estudantes quando ainda não foram despertados para o prazer da leitura. Ou não para a leitura do século XIX, para a leitura que pede óculos da época. Para gostá-los e entendê-los é preciso antes de tudo. querer lê-los.
Esta sempre foi uma questão que merecia discussão, mas agora que temos crianças e adolescentes que passam cada vez mais tempo na internet, é vital discutir como fazer a iniciação deles na literatura. Se já parece estranho ler um jornal de papel, que dirá livros de 200 anos?
Se acostumando a consumir informação pela internet, a leitura se torna cada vez mais sucinta, até superficial. Aí está o Twitter e seus 140 caracteres. Na internet a informação é devorada rapidamente e o apelo visual é muito forte. Fotos, animações e vídeos o tempo todo. Como lidar com esta sede de pirotecnia?
É preciso parar com essa idéia de iniciar os novos direto com os clássicos. É preciso uma leitura mais amena, com um texto mais leve, sem deixar a qualidade do conteúdo de lado, é claro. E o Brasil conta com escritores excelentes nesta área. Por que não começar pela crônica? Temos Luís Fernando Veríssimo, Mário Prata, Moacyr Scliar e tantos outros que são ótimos ritos de passagem para a terra das letras.
Afinal, depois que a onda do vestibular passa e a geração cresce, têm arrepios em topar com esses Machados de Assis e Gracilianos Ramos da vida. Criam um "trauma" com a literatura e preferem passar longe dos livros. Assim, perde-se mais uma geração de leitores. E esta conta vai aumentando em escala geométrica a cada nova turma que deixa as carteiras escolares, ano após ano.
Não podemos esquecer que literatura também é entretenimento e entretém aquilo que é agradável, o que temos afinidade. Vamos dar uma chance para que a meninada goste dos clássicos no momento certo.
segunda-feira, 21 de março de 2011
Perdemos pro Gaddafi
A visita estava marcada há meses mas os eventos na Líbia e o terremoto no Japão roubaram a atenção do Brasil e deixaram a missão diplomática fora de contexto, de certo modo. Fossem os EUA um jornal, a visita ao Brasil seria derrubada para Obama cobrir a guerra na Líbia, um factual. Obama pode não ser um correspondente de guerra à mercê de Gaddafi, mas foi criticado por dar a impressão de passear ao sol de Ipanema enquanto seu país comprava a terceira guerra simultânea.
Pobre Brasil. Teve os holofotes do mundo roubados no momento de desabrochar como a potência tropical, o oásis em que belezas naturais, povo alegre e êxito econômico fazem nossa nação virar o próprio Éden na terra. Perdemos a chance de sermos abençoados pelo messias de nosso tempo como o exemplo acabado de democracia renascida que de peito e sorriso aberto abraça o mundo. Nossa linda e potente democracia não foi páreo para as vestes psicodélicas de Gaddafi e sua ditadura de 40 anos.
Acho que Renato Russo tem razão:
"Quantas chances disperdicei/ quando o que eu mais queria/ era provar pra todo mundo/ que eu não precisava provar nada pra ninguém."