Juro que o barulho que ouvi foi uma campainha. Era um “dim-dom’ grave e aveludado. Ouvi
dentro da minha mente, hoje de manhã. Abri os olhos, assustado.
Sabia o que aquilo significava. O despertador não tinha
tocado. Procurei o celular. Ainda dava tempo de um banho rápido e correr para
trabalhar. Acordei sozinho, quase na hora em que meu despertador deveria me
expulsar do berço esplêndido.
O despertador que uso não é aquele simpático relógio
gordinho, com perninhas e dois chapeuzinhos barulhentos. Nunca soube dar corda
no antigo despertador do meu pai. Há anos é o despertador do celular que me
acorda.
Comprei um smartphone e meu antigo celular, agora sem chip, serve
apenas de despertador. Ele caiu no chão durante a noite, desligou e eu quase
perdi a hora.
Repare, quase tudo mundo usa o despertador do celular.
Duvido que muita gente por aí compre um despertador ou um rádio-relógio.
Falando em relógio, as munhecas estão nuas. É notória a
queda do hábito de usar relógio de pulso. Aquele relógio clássico, sóbrio. Tira
de couro, mostrador branco e analógico. Seria o equivalente à chuteira preta no
futebol. Sumiu.
Culpa do celular. O tempo faz um vai e volta danado. No século XIX as pessoas usavam relógio de bolso. No século XXI as pessoas sacam
do bolso o telefone celular para checar as horas. A tecnologia evolui, mas sutilmente tira uma com a nossa cara.