quinta-feira, 28 de novembro de 2013

Despertador, relógio de bolso


Juro que o barulho que ouvi foi uma campainha.  Era um “dim-dom’ grave e aveludado. Ouvi dentro da minha mente, hoje de manhã. Abri os olhos, assustado.

Sabia o que aquilo significava. O despertador não tinha tocado. Procurei o celular. Ainda dava tempo de um banho rápido e correr para trabalhar. Acordei sozinho, quase na hora em que meu despertador deveria me expulsar do berço esplêndido.

O despertador que uso não é aquele simpático relógio gordinho, com perninhas e dois chapeuzinhos barulhentos. Nunca soube dar corda no antigo despertador do meu pai. Há anos é o despertador do celular que me acorda. 

Comprei um smartphone e meu antigo celular, agora sem chip, serve apenas de despertador. Ele caiu no chão durante a noite, desligou e eu quase perdi a hora.

Repare, quase tudo mundo usa o despertador do celular. Duvido que muita gente por aí compre um despertador ou um rádio-relógio.

Falando em relógio, as munhecas estão nuas. É notória a queda do hábito de usar relógio de pulso. Aquele relógio clássico, sóbrio. Tira de couro, mostrador branco e analógico. Seria o equivalente à chuteira preta no futebol. Sumiu.

Culpa do celular. O tempo faz um vai e volta danado. No século XIX as pessoas usavam relógio de bolso. No século XXI as pessoas sacam do bolso o telefone celular para checar as horas. A tecnologia evolui, mas sutilmente tira uma com a nossa cara.


sexta-feira, 1 de novembro de 2013

Minha dívida com Lou Reed


Morreu Lou Reed.

- O que?! Esse filho da puta não pode morrer. Eu nem conheço ele!

Esse foi meu pensamento. Insensível e implacável, a Morte não me deu chance. 71 anos não foram suficientes para que desse tempo de eu entrar em contato com sua obra. Confesso, nunca tinha ouvido nenhuma música de Lou Reed. Não saberia dizer seu estilo soava punk, pop, metal, romântico ou sertanejo.

Poderia repetir o que já li, mas não opinar sobre o que já ouvi, o que é bem diferente.

Reed faz parte da lista de ícones da música que me aguardam ser apresentados. A lista é maior do que gostaria, inclui Patti Smith, Bob Dylan, Bruce Springsteen, Elton John, Frank Zappa, Prince, Stevie Wonder... Para ficar apenas nos artistas solo. Cada um terá sua hora.

Talvez eu esteja mentindo. Já ouvi Lou Reed. Esse cara não me é estranho. A obra do Joy Division está impregnada de Lou Reed, assim como a do Radiohead. Tenho certeza que do The Cure ao Cazuza, todos tiraram um pedaço do veio turrão para se inspirar.

A banda de Lou, o Velvet Underground, faz parte daquela galera que lançou seus primeiros discos nos anos finais da década de 60 e deu uma guinada definitiva na história do rock. Classificaria como os primeiros caras a fazer rock sem um sorriso no rosto. Destaco: o Velvet, The Doors, Black Sabbath, The Stooges.

Como é cafona lamentar a morte de um cara que você não ouve! Admito.

Por outro lado, foi o empurrão definitivo para finalmente ouvir. Minhas primeiras impressões: Velvet Underground tem muito do folk, muito de um rock alternativo que soa muito contemporâneo – mais uma prova do alcance de sua influência. Aliás, mais alternativo do que rock.

Meu pai começou a ouvir Beatles e virou fã a partir da morte de John Lennon. Passou seu gosto para mim. Insensível, a Morte nem percebe que dá nova vida a quem leva embora.


Neymar poderia ter sido um Diego Costa


O episódio envolvendo o atacante Diego Costa expõe mais um pouco de uma realidade no futebol brasileiro: a fuga cada vez mais precoce de talentos.

Observando os jogadores da seleção de hoje, ninguém se lembra de David Luiz ou Hulk disputando o Campeonato Brasileiro. Você saberia de onde saiu Dante e Luis Gustavo sem olhar no Google? Todos foram para fora ainda antes de se consolidarem como destaques do futebol nacional.

Mesmo caminho tomou o forte goleador sergipano, que ainda adolescente deixou o futebol brasileiro à Europa. Buscando seu lugar em times médios de Portugal e Espanha, deslanchou vestindo a camisa do Atlético de Madrid – é o atual artilheiro do Campeonato Espanhol e destaque dos colchoneros há mais de uma temporada.

Nos últimos dias, viu-se diante de um dilema. Ser mais um ilustre desconhecido com a amarelinha ou aceitar o convite para representar o país que o viu nascer para o futebol? Tomou uma atitude corajosa e coerente. Vai defender a Fúria.

Penso que, talvez, por pouco o Brasil poderia ter perdido Neymar numa jogada parecida. É conhecida a história de que quando o garoto tinha 14 anos foi levado para conhecer o Real Madrid, que queria contratá-lo. Seja por saudade de casa ou por qualquer maquinação de bastidores o futuro craque – e, principalmente, seu pai – recusaram a oferta e ele voltou a Santos. Poderia hoje ser um espanhol nascido em Mogi das Cruzes e uma das principais esperanças da seleção europeia para conquistar o bi mundial.

Neymar e sua equipe souberam administrar bem a “ansiedade” em levar o mais ousado & alegre jogador brasileiro para a Europa. Primeiro, ele fez história no Peixe se impondo como gênio da bola. Fora de campo gravou demoradamente a imagem de popstar nas retinas de fãs, patrocinadores, mídia. Foi embora quando já não havia mais degrau a alcançar dentro do país – pelo menos não individualmente.

Diego Costa não teve a mesma sorte. Com a camisa do Brasil, mesmo que artilheiro do espanhol, seria visto como mais um Hulk.

Da última convocação, outros nomes seguem a tendência sucesso/anonimato.


Responda rápido, corintiano: quem foi o campeão da Libertadores 2012 com a 10 nas costas? Foi Marquinhos, o juvenil zagueiro que herdou inscrição de Adriano, dispensado. Sem espaço na zaga experiente do time, poucos meses depois foi negociado e sua carreira decolou – Roma, Paris Saint-Germain e, agora, seleção em cerca de um ano. Pelo menos esse eu vou não precisar procurar no Google!

domingo, 13 de outubro de 2013

Futebol


“A rodada tinha tudo para ser perfeita para o São Paulo. Meu domingo acabou depois do pênalti. Era melhor que o juiz nem tivesse marcado nada”. Após ler o comentário do torcedor, o radialista do programa pós-jogo tenta tirar por menos. “Pô, não fica assim não, Douglas. Não acabou o domingo não, curte o domingo. Isso é... Futebol”.

Talvez o locutor quisesse dizer que isso é “diversão”, é “entretenimento”. “Ô Douglas, fica assim não que isso ai é só brincadeira”. O problema é que assim ele falaria como aqueles que dizem “o time ganhando ou perdendo eu não vou ficar mais rico nem mais pobre. No dia seguinte tem que trabalhar e os caras lá continuam tudo milionário”. Esse pessoal não entende quando a explicação é que isso é... Futebol.

Mais do que esporte. Mais do que um programa na TV. Maior que...

Para você entender, vou tricotar aqui uma teoria de fim de domingo. Se o comportamento extremo de uma sociedade diz algo sobre ela, no Brasil temos a seguinte situação: aqui ninguém mata ninguém por causa de religião, mas tem gente que morre por causa do futebol.

Nas cadeiras vermelhas do Morumbi o “Show do Intervalo” foi dos melhores momentos da borracha militar castigando a carne de gente que adora uma confusão. Estão dizendo que os torcedores do São Paulo queriam vencer a barreira para chegar à torcida do Corinthians – e não era para dar os parabéns pelas defesas do Cássio.


Futebol faz o são-paulino Douglas perder o domingo porque uma bola de borracha não passou entre dois postes separados por 7,32 metros. Futebol fez outros tantos são-paulinos enfrentarem a fúria da borracha da polícia. É também o futebol o responsável por este corintiano se sentir um pouco mais rico.

sexta-feira, 27 de setembro de 2013

Mataram a MTV


Não vi o fim da MTV. Assim como não vi o início da MTV. Nem o meio. Muito menos seu auge ou sua decadência. Porém, a MTV morreu e estou morrendo de saudade dela.

Pra muita gente assistir à MTV na infância ou adolescência era tão fácil quanto abrir a torneira mas pra mim era um sonho. Se em São Paulo o canal tinha sinal aberto, na minha casa, não. Nunca soube direito se São José dos Campos recebia o sinal da MTV mas posso garantir que na Vila Nova Cristina, numa casa de número 163, não.

Foram raras as vezes em que consegui assistir a alguns clipes ou ver um programa inteiro. Eu dependia de visitas à casa do meu avô, que era o único que tinha TV por assinatura, que custava uma fortuna. Era um copo de coca e uma tapa na minha irmã, que queria ver Cartoon Network. Tempos difíceis.

Imaginava em casa um canal que só passava rock e isso me fascinava. Na escola amigos imitavam o Marcos Mion e falavam sobre o Covernation. Aquelas vinhetas e a linguagem totalmente diferente dos outros canais me deixava louco... e frustrado. This is not for me, baby.

Fui crescendo e acompanhando de longe a decadência do canal. Não falavam mais da MTV. Alguma coisa ou outra sobre programa de humor, de comédia. Ué, mas o lance ali não era música?

Há pouquíssimo tempo finalmente me tornei espectador da MTV. Percebi o que aconteceu. Cadê a música, meu Deus? Os melhores horários da MTV eram de madrugada ou no início da manhã, quando reprisavam clipes clássicos. O resto, sinceramente, não descia. (O único programa de humor que gostei foi o jurássico Rock & Gol).

Talvez a decadência da MTV reflita a decadência da música pop brasileira, do rock brasileiro. Porém, bandas boas e novas ainda existem, só que o canal era mais um apaixonado por essa galera que faz uma MPB melancólica, pretensiosa e modorrenta e todos engolem que isso é rock.

Li em algum lugar que o pecado da MTV foi se voltar ao público adolescente de hoje e dar as costas para o espectador crescido, mas que ainda se interessa por música. Era triste ver que  pílulas de 1 minuto durante os comerciais era o máximo de debate e opinião sobre música apresentado atualmente ali.

Talvez a molecada de hoje preferiu assistir Porta dos Fundos no computador  enquanto conversa com alguém pelo Facebook e quem queria conhecer mais sobre música encontrou no Youtube o que a MTV há muito deixou de mostrar.

Bom, o que sobrou pra mim, uma criatura que ainda se importa com a TV? O canal BIS tem se mostrado um alento, com seus documentários gringos e nacionais sobre – graças a Deus – rock. Tem também muitos shows e clipes de novidades da música, onde percebo que a chatice e o bocejo ainda são hegemônicos. Talvez a culpa não seja da MTV, afinal.